25 abril 2011

Onde estavas?



Aquela pergunta que ainda ouvi várias vezes aqui a perguntar “onde estavas no 25 de Abril?” nunca ninguém ma pôs.

Muitas vezes a tinha lido na versão original: “Ou tu étais à la Libération?” Mas era posta a pessoas de uma geração anterior à minha.
Mas onde eu estava no 25 de Abril de 1974?



Era uma quinta-feira como as anteriores. Já não me lembro se estava sol, devia estar frio. Passavam algumas semanas da morte de Pompidou.

Acordámos mais tarde do que costume ou atrasámo-nos no percurso entre Palais-Royal e a Porte d’Orléans. Como de costume atravessámos o square em direcção a Montrouge, a rua do 11 de Novembro ainda estava a alguns seis ou sete minutos.

Chegámos ao primeiro andar e a porta já estava fechada. A aula tinha começado. Restavam dois lugares, do lado esquerdo, de costas para a janela, naquele U que estava voltado para o quadro e para a mesa do prof.
Alto, de fato cinzento, meias coloridas e provocadoras o professor continuou a sua frase. Mal tive tempo de pousar-me na cadeira, Monsieur Guerrand voltou-se para mim e, com aquele olhar agitador, levantando mais uma sobrancelha do que a outra, que lhe conhecíamos, perguntou: “Alors, c’est la Révolution au Portugal?”

Foi como uma pedra a fazer círculos numa poça de água. Fala de Spínola. Trocamos mais uma série de frases. Metade da turma sabia mais do que eu.

O nome de Spínola, do general de quem eu pouco sei, inquieta-me. Não imagino, pouca gente imaginava em França, que havia militares de esquerda, bastava olhar para o Chile. Marie-Louise empresta-me o quarto e o rádio que lhe servia de despertador. Passei a manhã a tentar ouvir os noticiários em ondas longas, a tentar perceber a situação em Lisboa. Ao sair, direcção à banca de jornais para comprar o Le Monde.

Depois foi o tentar encontrar os amigos. As reuniões nocturnas. O tentar saber o que se passava em Portugal. As reuniões do fim-de-semana na rua do Château. Os mais rápidos a alugar a camioneta de emigrantes para Lisboa no 1º de Maio. O correr para o Consulado para pedir o Passaporte. Não tinha telefone, nem tinha o número de telefone de amigos (poucos) em Portugal. Era o receber jornais pelo correio…

Não vim ver o 1º de Maio a Lisboa mas fomos para a République marcar a presença portuguesa nesse dia.


Postumamente agradeço a Roger-Henri Guerrand tudo aquilo que me ensinou, em particular, o ter-me despertado o interesse pela problemática do alojamento social. Ainda hoje me lembro das suas aulas em que falava das ideias de Charles Fourier e do Familistério de Guise. 


Coincidência:
Ontem encontrei este video no Parisien. Aconselho o visionamento àqueles que, eventualmente, ainda não conhecem este exemplo de alojamento social do século XIX.