23 fevereiro 2012

Demoiselles


imagem publicada aqui


Sob este título publiquei há poucas horas um comentário num blogue que costumo ler.

Em si, o comentário traz pouca coisa ao assunto principal mas decidi publicá-lo aqui pois a preguiça tem sido alguma para alimentar este meu blogue.

"Tratamentos e "usages"

Não me apraz muito ter que voltar aqui com os meus comentários.

Na verdade, mais uma vez, usei demasiado da provocação. Agora tenho que a defender.

1. As Mademoiselles - há aquelas que admiro, como a Deneuve, e aquelas que ... enfim, digo que não pertencem  ao meu mundo, como a Chanel; por questões óbvias, mas ambas marcaram a minha existência. Agora, a nossa dificuldade de querer traduzir situações pessoais é (era) menos evidente.

2. As Demoiselles continuarão a existir, não nos preocupemos muito. Talvez daqui a uns anos terão o mesmo lugar na língua comum dos Demoiseaux.

3. Duas historinhas, que talvez apareçam noutro sítio:

a. Durante anos morei no 186. Prédio burguês, centro da urbe, metro a duas pernadas da "porte cochère". A minha companheira era descendente de uma pessoa conhecida por todos os antigos habitantes. Acesso por uma das escadas de serviço (daquelas onde se encontra uma porta esconsa de dois em dois andares). Duas solteironas como vizinhas (tratamento a que me dá direito actualmente a minha idade) no primeiro andar vivia a Madame C. - mulher dinâmica que preferia passar alguns dos meses do ano longe do seu domicílio. A outra, toda a gente a tratava de Mademoiselle L. muito digna, encontrava-a quase no quotidiano a subir até ao seu "deux pièces" no quinto, ia à missa a Saint Roch e era voluntária Maltesa (não porque lesse o Hugo Pratt, mas porque visitava hospitais). Mesma situação, mas tratamentos diferentes.

b. Ficar com o nome. Durante anos, ao ler determinados documentos oficiais, aparecia o meu nome seguido pela menção "époux D." nunca me preocupei.
Era a maneira de me distinguir de outra eventual pessoa que tivesse o meu nome. Não estava escrito na minha testa, não aparecia nos meus documentos
oficiais (aquelas chatas "Carte de séjour"), não me incomodava. Mas como os momentos da vida são efémeros assim como as ligações (por menos perigosas que o possam ser), um dia apareceu a ruptura. Hélas! Antes de comparecermos diante do advogado, C tinha pedido para conservar o Dias, profissionalmente era conhecida assim. Claro que nada tive a opôr. Também tinha essa opção mas como eu nunca a utilizei, não usufrui posteriormente.


...

Durante anos e anos que vivi em França nunca pensei nessa hipótese. Também me casei sobre o tarde, e nessa altura não seria pelo facto de usar o nome da minha esposa que modificaria a minha inserção (e não integração) na sociedade em que vivia. 

Não prescindo de ter um olhar diferente, ainda hoje (agora aqui) apesar de todas as memórias, de todos os kilómetros percorridos, sou um homemque vive no seu espaço e no seu tempo, mas, de certeza absoluta, com uma vivência diferente de muitos daqueles que me conhecem.

p.s.: quem passa sob a chuva, fica molhado. Uns secam mais depressa o que outros, mas as cicatrizes da chuva nunca desaparecem."

Já agora, só para relembrar: o tema principal deste assunto é a posição da mulher na sociedade, a maneira como é vista pelos outros. Isso também nos poderia levar a levantar a lebre do "reconhecimento" do casamento que está tão ancorado na maneira de pensar portuguesa. É bom lembrar que em França existe o PACS (Pacte civil de solidarité) que, a meu ver, demonstra que podem existir outras maneiras de oficializar uma união entre duas pessoas. Evolução da sociedade, evolução da burocracia e reconhecimento igualitário de duas pessoas que assumem uma relação.