14 janeiro 2011

Foi no Batalha!






Aqui há tempos, eu perguntava se era o Porto que não gostava dos cinemas ou se era o Cinema que não gostava do Porto.

Agora o Batalha foi!

Não foi agora, já tinha sido nos finais de 2005, quando foi investida a linda soma de um milhão de euros!

Agora louva-se a obra arquitectónica que veste uma parte da praça da Batalha.

Agora chora-se um mítico cinema desaparecido.

Mas olhando bem para trás, para aquele Outono de 2005 em que fiquei com os cabelos em pé quando soube que se desconhecia o fresco do Júlio Pomar (http://dotempoedaluz.blogspot.com/2006/01/ainda-os-frescos-do-cinema-batalha-do.html  http://dotempoedaluz.blogspot.com/2006/01/cinema-batalha-porto.html ) que durante meses tinha estado visível numa das paredes do cinema desenhado pelo arquitecto Artur Andrade, o futuro de um marco cultural na baixa da cidade já estava bem trémulo![1]

O chamado Gabinete do Comércio Vivo? Nunca soube o que era. Sabia sim que era uma emanação da Associação dos Comerciantes do Porto. Nem consegui saber se tinha uma existência jurídica.

Cinema? Fazer reviver o cinema nas paredes do Batalha? Depressa deixei de ter essa ilusão. As paredes iam sendo pintadas, assim como as estátuas de gesso (alguém saberá para onde foi o Bambi?). Um sistema de som acompanhava os plasmas nos amplos espaços. Renovavam-se as cadeiras da plateia, etc. Foi assim que eu entrei, ao fim de muitos anos no Batalha.

A azafama, as preocupações principais estavam no invólucro. Ninguém se preocupava com o conteúdo.  A D. Laura Rodrigues fazia como sabia. Não sei se na altura foi elaborado algum projecto sério sobre o aproveitamento do espaço com fins culturais. Mas na altura fiquei com a certeza que já não haveriam mais “matinées clássicas” ao fim de semana, já não haveria um sucessor do Neves Real para a programação cinematográfica. Os dois grandes e velhos projectores da cabine da sala grande oxidavam-se apesar da espessa camada de pó que os cobria (devem ter ido para ao ferro-velho, não tiveram a sorte dos que estavam no Rivoli e que encontrei desmontados no Museu das Ciência e da Indústria, ali no Freixo).

Lá para Maio de 2006 lá fui ver uma sessão de cinema na sala Bebé. O Batalha estava a reviver mas praticamente sem cinema. A sala Bebé passava os filmes que entidades exteriores traziam. Mas o Batalha tinha um restaurante, um bar, música e tornara-se um local que muitos portuenses desejaram conhecer. De maneira episódica havia concertos na sala principal. O projector 35 mm da sala Bebé que datava dos meados do século XX e um projeccionista que lhe gabava o desempenho. Uma sala Bebé onde o som do filme por vezes era abafado pelo ruído que nos chegava da rua.

Pelos vistos o Gabinete do Comércio Vivo não tinha vocação ou não tinha meios para desenvolver um projecto cultural. Abria as portas para os DJ’s ao fim de semana e os jovens tinham um local para se divertirem. Assim se contribuía para a animação do centro da cidade.

Hoje, Agora, Aqui – 14 de Janeiro, meia-noite e tal, Cedofeita
Uma lágrima que deixamos cair. Uma tristeza passageira.
Só faço votos para que não transformem o edifício. Pelos vistos ainda não está classificado como Património. (http://www.igespar.pt/pt/patrimonio/pesquisa/geral/patrimonioimovel/detail/329677/)

Que façam lá um hotel ou um casino (pelos vistos os bingos já não são rentáveis), um dancing ou uma Fnac, um Mac Do ou um Outlet, uma agência bancária ou uma piscina. Mas que não toquem na sala Bebé, eu gostaria de passar lá de tempos a tempos ver um filme daqueles antigos em película. É uma sala que está gravada na minha memória.

Eu continuo a ver o cinema de sofá, com o telecomando ao lado, a dois, interrompendo de vez em quando para rever uma cena ou para ir buscar uma bebida.

Já agora, porque não aproveitam a sala Bebé para começarem, provisoriamente a actividade da Cinemateca no Porto?


[1] O fresco de Júlio Pomar não desapareceu por acaso. Foi em represália política que foi totalmente recoberto. Aparentemente não era possível recuperá-lo em finais de 2005. Ficaram as imagens fotográficas. O relevo da fachada foi igualmente censurado pelas autoridades do Estado Novo, mas foi parcialmente reposto como o original.  


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