Quando cheguei a Paris a Samaritaine já fazia parte daqueles “Grands Magasins” que estavam parados no tempo. Os dois outros que cheguei a conhecer foram os do Louvre e o Bon Marché.
Eu sempre gostei daquele dédalo de lojas com passagens aéreas e corredores subterrâneos.
Logo quando cheguei, o Bastos tinha-me mandado pelo correio algumas moradas de amigos comuns que eu não tinha levado por questões de segurança. Alguns deles tinham moradas de correio mais ou menos fantasmas, o telefone era raríssimo. Contactei o Raul B. e o Luís V.
O Luís encontrava-o mais ou menos uma vez por semana ali no Châtelet, normalmente ao princípio da tarde no Zimmer. O Luís na altura militava nos grupos de emigrantes mais ou menos organizados, fazia teatro, eu não. Eu tentava conhecer a realidade na grande cidade. Um dia resolveu comprar um boné, achava que o boné o protegia do frio ou coisa que o valha. Foi a primeira vez que entrei na Samaritaine, naquele fabuloso mundo do consumo.
Vinha eu da Samaritaine, depois de ter comprado uns quilos de estearina para fazer velas na rue de la Grande Truanderie, em casa do Raul, quando encontrei a C. H.
Eu estava com o Marimba, ela sozinha. Eu de sobretudo cinzento. Ela com um casacão e um grande cachecol, devia vir do foyer da rue de la Cossonnerie. Foi na antiga rue Rambuteau, situo, hoje ali quase em frente ao Léon de Bruxelles. Ela ainda hoje deve dizer que eu trazia um frango debaixo do braço. Não foi amor à primeira vista, mas eu estava com uma certa curiosidade em conhecer a francesa que falava português. Mas isso é outra história.
Quando morei em Rivoli a Samaritaine era o sítio onde comprávamos já fora de horas a alimentação e os produtos de drogaria, ou aquelas compras para a casa, sobretudo depois de o Louvre ter fechado.
Depois a Samaritaine foi perecendo só lá ia mesmo para encontrar coisas obsoletas difíceis de encontrar noutro sítio, ou então, para subir ao último andar e olhar para o Sena quase em frente do Pont-Neuf.
Quando estive em Paris com a C. T. a Samaritaine já estava fechada, nem pensar em lhe mostrar a vista daquele terraço. A Samaritaine estava morta!
Bom. E o título? O título tem a ver com uma história que me contou o Artur M.
O Artur como tantos outros da minha geração tinha partido para França sem grande informação da situação. Eram os anos sessenta, só conhecíamos o que nos era contado pelos turistas, o resto fazia parte do nosso imaginário. Atravessávamos duas fronteiras e encontrávamo-nos noutro mundo, noutra realidade. O Artur ao chegar a Paris a primeira coisa que fez foi comprar o “l’Humanité” num quiosque.
Poder comprar um jornal comunista! Tentou decifrar as frases, as notícias. Vira uma página e encontra um grande anúncio da Samaritaine.
Anúncio no Humanité? Devem ser os grandes armazéns do povo, pensou ele. Talvez descontos para os trabalhadores com cartão do sindicato.
Um dia, tirando algumas horas ao pouco lazer que tinha lá foi visitar o armazém. Foi assim que descobriu o templo do consumo!
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